Ó tempora! Ó mores! Ó angustia! Enquanto isto Caetano canta: “Gente foi feita para brilhar e não para morrer de fome.”
O caro leitor há de convir que, sai governo, entra governo e a pátria amada idolatrada salva salve continua a mesma: todo mundo fala e ninguém se entende, é que nem a corte do rei Pétand, citada pela senhora Pernelle, protetora de Tartufo, que disse que nessa corte nada se respeitava e todo mundo falava o que lhe vinha às ventas.
Que eu estou angustiada, isto estou. Eu que tenho aonde cair morta; que posso cuidar dos meus possíveis males; que mato a minha fome e a minha sede à hora que desejar. Mas... e os outros? Aqueles que vivem por que Deus quer; que morrem por que Deus quer; se a seca castiga é por que Deus quer; se chove é por que Deus quer; se comem ou passam fome é por que Deus quer; que moram num barraco ou debaixo de uma ponte é por que Deus quer...
Invejo a fé dos zés brasis, admiro a sua reverência, o chapéu na mão, olhar para o alto em busca de Deus... Quem sabe um dia eu chego lá. E enquanto a fé não chega e a angustia não passa, vou sair por aí e fazer uma saudação mentirosa a um valentino qualquer, como fazia o inquieto e bem mais atormentado do que eu, Santo Agostinho, que em uma das suas andanças encontrou um pobre mendigo bêbado que ria e fazia arruaça. A cena embora o aborrecesse, revelava um aspecto da verdade que procurava. O bêbado com um pouco de dinheiro alcançava a felicidade.
Sabia o santo que a alegria do bêbado não era autêntica. Mas pôs em dúvida a alegria que ele procurava com as suas ambições e enredos tortuosos. Numa noite o bêbado digeria o vinho e sua bebedeira passaria; ele, Agostinho, ao contrário, iria dormir e acordaria com o mesmo tormento, hoje, amanhã, quem sabe até quando...
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