sexta-feira, 30 de novembro de 2007

QUE ME DEIXE SONHAR



A sociedade movida por uma conjugação de fatores vive em permanente estado de insatisfação. A nação reclama pelos mais diferentes motivos. O governo reclama de si próprio.

Sociedade + governo = NAÇÃO. E a nação que reclama é a nossa. O que falta, então, para que ela saia dessa reunião de condições e motivos adversos, que mais parece uma roda dentada que só se move segundo o plano que a criou?

Faltaria a esta nossa nação um grande homem? Um que de fato decidisse, agisse, determinasse? Por que não surge a figura desse grande homem, já que, segundo dizem, ele é feito pelas circunstâncias e circunstâncias existem?

Será que a nossa história sempre será uma triste história? Será que o tempo passa e apesar disso ainda possamos ver grupos correndo atrás de bichos? Será que não podemos resolver os nossos problemas de forma coletiva? Será que continuaremos a falar indefinidamente sobre pessoas ao invés de discutir coisas? Teria razão o marechal-de-campo de Hitler de nome Von Brauchitsh, que acreditava que há um livro de destino onde a história humana independe do que os homens possam fazer?

Acton deixou escrito: “ Nada causa mais erros na visão da história que o interesse em indivíduos”. Sabemos que nem sempre de personagem central viveu a humanidade. Estão aí registradas as revoluções neolíticas, comercial e industrial, que foram grandes fenômenos coletivos que envolveram a colaboração gradativa de enormes multidões de observadores, experimentadores, repetidores, aperfeiçoadores etc.

E, se coube a mulher a mais importante e revolucionária das descobertas neolíticas, que foi o método da reprodução dos vegetais e conseqüentemente a agricultura, (incluindo-se aí algo sobre irrigação, aragem do solo etc.) que nem mesmo a descoberta da máquina a vapor ou de energia atômica foi tão revolucionária e teve alcance tão profundo no destino da nossa espécie. Que sejamos nós mulheres, as precursoras de uma nova revolução onde se possa deter, e mesmo inverter o curso dos acontecimentos, que possamos com a acuidade já demonstrada de “cientistas”, descobrir uma novo método de reprodução. Desta vez, não de vegetais, mais de sentimentos, onde a solidariedade humana floresça e que este pedaço de chão, que é a nossa pátria, seja de fato comum a todos os seus filhos, com os mesmo direitos, deveres e obrigações.

Enquanto nada acontece, que me deixe sonhar e sonhando espero que surja entre nós a figura de um grande homem ou de uma grande mulher, que absorva as tendências sadias desta nossa sociedade e explique de forma clara o que essa mesma sociedade espera ouvir. Um grande homem ou uma grande mulher que nos chefie, que decida, aja, determine.

sábado, 24 de novembro de 2007

OBSERVANDO O NADA




Outro dia me vi escrevendo um poema . Aí bateu uma saudade de barulho de bonde e desejei perto de mim ouvidos que me escutassem dizer o tal poema. Não explico a saudade do barulho de bonde. Ouvidos não os tenho por perto, sou reclusa, situada em algum lugar, numa casa de muitas portas e janelas, sem sótão nem porão, onde arrasto as sandálias , ora no andar de cima, ora no andar de baixo, á procura de não sei quê, escutando o silêncio, observando o nada.

Desta conversa comigo mesma, de repente me dou conta de que não sou nenhum pavão misterioso mas não tenho nenhuma história para contar. Será....? E de quando fui criança? Do que me lembro, só um sentimento de inveja, feito o que sentia da família da casa de frente à minha... Desejava aquele pai / figura bonita de homem / seu rosto nunca alcancei / mas feito gato/ olhar pidão / por suas pernas trancei / invejava os filhos dele / pelo amor recebido / pelo castigo infligido / queria aquela família / mesa posta/ comida franca / Natal / presentes trocados / aniversário / batizado / tudo isso festejado...

O que diria da adolescência ? Só isto: viagem, regresso, um trem, estação, casa, gente, rostos tristes, cheiro de incenso, de cravos. Velas. Um caixão. Dentro dele uma mulher. Minha mãe.

De mim adulta? Só sei que houve quem à mim dissesse: “ E tu aí nesse lugar, alma viva, afasta-te destes que são mortos”. Então alguém partiu e eu segui os seus passos; não para ver estrelas. Ainda estava a caminho do inferno.

Li de Shopenhauer que, quanto à vida do individuo, cada biografia é uma história de dor: por quanto em regra geral, cada existência é uma série contínua de grandes e pequenas desventuras que cada um, é verdade, esconde o melhor possível, porque sabe que os outros raramente demonstram interesse ou piedade e quase sempre satisfação, à vista dos afãs de que no momento estão salvos; mas talvez um homem no fim da vida, se é que possui toda a sua razão e é ao mesmo tempo sincero, desejará recomeçá-la e, diante duma tal perspectiva, antes preferiria o nada..

Ah, sim, quanto ao poema, esqueci de salvá-lo, deve ter caído na lixeira do computador.











domingo, 18 de novembro de 2007

VULCÃO EXTINTO



Hoje amanheci com os olhos da negação. Não vejo mistério no cosmos, não vejo mistério na vida. Recuso o olhar incomum e a perspicácia em captar detalhes. A palavra não a quero polivalente. Que se vá a conotação e que fique a denotação. Aceito Bernardo Guimarães quando diz “profetas talhados em gesso”, disse e explicou e não estou nem ai para Manuel Bandeira com seu verso “pedra-sabão lavrada como renda”. Digo: chegou a tarde e depois dela vem a noite. Descrevo a paisagem vislumbrada da janela como um matagal que existia e atearam fogo, os grilos que lá moravam invadiram a minha casa e o meu sono que era bom acabou. E que a minha vontade é de sair por aí chutando pedras.

Pedras não chutei, mas o sair por aí aconteceu: segui o caminho do mar. Avistei-o. Atraiu-me e me fez contraditória... Foi um olhar incomum que lhe lancei. Estava ele lá, manso feito um lago, talvez com preguiça ou quem sabe feliz pelo vazio de suas praias, por não precisar dar movimento às suas águas e fazer surgir as ondas e com elas tentar expulsar de dentro de si tanta gente desconhecida e que vai chegando sem o mínimo de cerimônia, ocupa suas praias, as cobre de sujeira, espoja-se na areia e sem pedir licença joga-se com a maior intimidade por sobre suas águas, mergulhando-as e com braçadas deselegantes tenta rasgar suas entranhas.

Acomodado estava o mar, acomodado como eu, que mais pareço uma faixa de terra que vez por outra sofre abalos sísmicos para depois se justapor. Anos a fio venho sofrendo dentro de mim um processo de acomodação de sentimentos com a maestria de fazer inveja à natureza. Nada destruo, embora vez por outra haja ameaça de ativa vulcanização, logo abafada pela falta de sintonia entre o sentir e o deixar fluir, não mais existe força nem motivação, a matéria em fusão natural já não produz a lava e sem lava não há erupção. Vulcão extinto é o que sou.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

O PORQUÊ DE ALGUNS


“Procurem outra companhia;
já vejo daqui o fim do meu
caminho” (Collete)

Se escrever é preciso e se dentro de mim dormem palavras, que por favor acordem, desencantem, ordenem-se e dêem vida aos meus sentimentos.

Acredito não ter tido na infância as respostas para todos os meus “por quês”, razão pela qual eles me perseguem até hoje, se bem que em outra escala. Se leio um texto sinto necessidade de inteirar-me sobre o autor. Isto posto, fico eu a escarafunchar as entrelinhas, sempre em busca de um “por quê”.

Enfim, por que escritores escrevem, quais as razões, os motivos pelos quais os levaram a escrever? Motivada pela curiosidade busquei entre alguns autores os seus ‘porquês’.

E lá vou eu , contrariando gostos - que não se discutem – com ar professoral e didatismo pedante, estribar-me no conhecimento alheio para ilustrar o que ora trato.

Vejamos o que declarou Giovanni Boccaccio (1313/1375): para fugir ao ambiente rígido e ambicioso que o cercava começou aos sete anos de idade, a imaginar fábulas e a escrever contos.

O inglês Henry Fielding (1707/1754), não sabia que profissão abraçar; cocheiro ou escritor? Para ser cocheiro teria de se colocar a serviço de algum proprietário de carruagens, ao passo que, como escritor, necessitava tão-somente de caneta e tinta. Quanto ao papel, poderia aproveitar aquele em que viessem embrulhados o tabaco e o pão. E, diante das opções que se apresentavam, tendia mais a escrever que a mourejar numa carruagem aberta.

Do alemão Wolfgang Goethe (1749/1832), que aos dez anos de idade viu Frankfurt ser ocupada pelos franceses e ouvindo falar essa língua, entusiasmou-se com as referências e os elogios aos escritores franceses; Moliére, Racine e Voltaire, sendo assim motivado pela cultura francesa e não alemã, a seguir a carreira literária.

O francês Honoré de Balzac (1799/1850), desde pequeno tinha um sonho: viver em sociedade entre aristocratas, imortalizado pela atividade literária. Lutou por esse sonho. Não se tornou um aristocrata, mas imortalizou-se como o grande retratista da burguesia do século XIX.

O inglês Charles Dickens (1812/1870), que para curar uma paixão mal-sucedida, iniciou a escrever. E descobriu em si a necessidade de se comunicar com um público maior do que aquele dos salões onde brilhava.

O francês Chaderlos de Laclos (1741/1803). Tornou-se escritor por conta de um desejo: redigir um livro que fizesse escândalo e fosse comentado mesmo depois de sua morte. Desejava escrever contra os aristocratas, visto como parasitas sentados no poder e conquistar a glória através das letras. Conseguiu publicando ‘As Relações Perigosas’, que foi sucesso imediato.

Ditas ass razões que levaram alguns dos meus eleitos a se manifestarem através da linguagem escrita, acrescento que, em se tratando de “vertentes” literárias, deixo com o estimulador da literatura engajada – aquela em que, claramente, toma partido em cada situação ou momento histórico – Jean-Paul Sartre, a palavra final: “Toda literatura é, a rigor, comprometida, pois mesmo o silêncio constitui uma opção decisiva”.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

REFLEXÕES DO MESTRE



Pelas barbas do profeta! Hoje está difícil arrumar um tema , a não ser que deite falação sobre um livro que me chegou às mãos, escrito por um escritor santista de nome Homar Paezkowski, que tem este título: Onorismos Ígneos, e começa assim: Em algum lugar, em alguma época situados no nunca. Lugar algum onde o além tangencia o eterno, a sombra do nada cobre coisa alguma, o vazio enche o infinito de tudo que o nada contém...

O linguajar do senhor Paezkowski é tão complicado quanto o seu nome, mas prometo, que num futuro que já passou; numa manhã que foi ontem; sentada com a calma dos aflitos, de pé eu não o lerei.

Já que achei o fio da meada e a largada está dada, lembrarei uma saudade minha que se chama Mário Moacyr Porto, de quem guardo estas reflexões:

Chegar é bom para os moços, porque para eles, os caminhos não terminam, mas se sucedem. Mas para os velhos, a quem a vida, bem ou mal, satisfez todas as aspirações, chegar é não ter mais para onde ir.

O lucro, a vantagem, a recompensa, é aspiração inerente à condição humana, até mesmo no plano transcendental. Suprima-se o céu das religiões que nenhuma delas sobrevive. O céu é a recompensa corrigida do sofrimento de viver.

O homem só é livre por uma única razão: pode morrer quando quiser.

Há pessoas que dão a César o suficiente para não se prejudicar e a Deus o bastante para não se perder. Dividem a alma e o corpo sem deixar restos. Dão a Deus o que é do diabo e ao diabo o que é de Deus.

Cada dia tem a sua quota de sofrimento. Não antecipe para hoje a angústia de amanhã. Não aprendi esta lição no consultório de um psicanalista, mas na Bíblia de Cristo, para quem o homem não é apenas uma transcendência divina, mas também o ingênuo parceiro de Eva que cedeu a tentação de provar a maçã. Um pecado venial de recém-nascido guloso. Na qualidade de ex-magistrado, acho que a expulsão do paraíso foi uma condenação exorbitante. Finalmente, não devemos ter vergonha de fazer o que Deus não teve constrangimento em criar.

Nada mais triste do que uma criança triste. Triste e injusto. Será que Spinoza tem razão quando afirma que Deus existe, mas não intervém ou se envolve com a sorte das criaturas que expulsou do paraíso?’

E agora, mestre, a respeito desta última reflexão, já que o senhor está aí por cima, não existe um jeitinho de dizer pra nós se o Spinoza tem, ou não tem razão?