terça-feira, 1 de abril de 2008

E EU NEM MORO EM YONVILLE

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O dia chuvoso, a hora 16:00 , a vida quase parando e eu pensando feito Fernando Pessoa: “eu não sei pra onde vou mas não vou por ai”. Só sei que não posso mais correr na chuva nem tampouco sentar na calçada de canudo e canequinha e fazer bolas de sabão.

Daqui a pouco chega a hora do Ângelus e eu por certo vou sentir saudades da Ave-Maria do padre Eyamard com fundo musical de Augusto Calheiros cantando: ...Cai a tarde tristonha e serena em macio e suave langor...

A chuva continua..., a hora 18:00. Na minha saudade, as tardes serenas; só me resta pedir à mocinha que me serve, o meu rosário e debulhando, dizer para Maria que, ao contrário dela, não tenho graça nenhuma.

Toda essa melancolia e eu nem moro em Yonville pois, segundo o mestre do Realismo francês, e eu ai me refiro a Gustavo Flaubert, lá a vida era monótona e sem atrativos, dos que por lá residiam apenas Ema Bovary foi capaz de escapar à mediocridade do ambiente, enfrentando os preconceitos e perseguindo os próprios sonhos e aspirações. Ta certo que a coitadinha acaba destruída: tomou uma dose excessiva de arsênico e para desespero de Carlos, seu marido, foi rastejar no vale dos suicidas. Mas é bom que se diga: Ema matou-se menos por ser adúltera, do que pela incapacidade de enfrentar as dívidas contraídas para salvar o amante.

Maiores detalhes sobre Ema? Fácil, fácil, é só ler Madame Bovary, de Gustavo Flaubert, que passou cinco anos de trabalho incessante na elaboração deste romance (1851/1856), gastando noites em busca de um objetivo, semanas atrás de uma frase, escrevendo a reescrevendo a mesma página dezenas de vezes, buscando assim a forma perfeita, a palavra certa. Valeu o esforço do autor, pois Madame Bovary o tornou em pouco tempo um dos romancistas mais célebres da França. Além de ganhar um ruidoso processo, uma vez que a censura da época considerou a obra imoral. A verdade porém, afirma um dos biógrafos de Flaubert, o romance atacava a moral burguesa posta a nu em sua fragilidade, convencionalismo e falsidade. E, quando o autor ao final do livro, dá como vitorioso o mais estúpido dos personagens retratados, o farmacêutico Homais, protótipo do interesseiro falso que se presume intelectual, a sociedade burguesa sentiu a força do ataque e seus representantes no poder, trataram de punir o atacante. O autor foi absolvido e o livro teve a sua edição esgotada em pouco tempo.

Perguntado a Flaubert quem era Madame Bovary, respondeu: “Madame Bovary sou eu”.

A chuva persiste e a música de Antônio Vivaldi: “The Four Seasons” –Concerto n. 4 – Winter (allegro nom molto), me cria uma atmosfera de paz. Quanto a hora, já passa das 2:00 da madrugada. Pensando em Madame Bovary, começo a contar carneirinho ...


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